Título no Brasil: Late Bloomers – O Amor
Não Tem Fim
Título Original: Late Bloomers
País de Origem: França / Bélgica / Reino Unido
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 94 minutos
Ano de Lançamento: 2011
Direção: Julie Gavras
Late Bloomers - O Amor Não Tem Fim (trailer)
O filme “Late Bloomers
– O amor não tem fim” aborda com maestria o envelhecimento do homem e da
mulher.
Para falar sobre o
filme hoje passo a palavra para Ruth de Aquino, colunista da revista Época.
Deixo também, a entrevista com a antropóloga Mirian Goldenberg e o psicanalista
Sócrates Nolasco expondo suas visões sobre o envelhecimento.
Entrando nos sessenta
A reação de homens e mulheres ao passar dos anos é diferente? Depende. Da
velhice, só escapa quem já morreu
Por Ruth de Aquino
Como a mulher e o homem confrontam os 60 anos? O novo filme da diretora Julie Gavras,
exibido na mostra internacional de São Paulo e com estreia prevista para 11 de
novembro, trata de envelhecimento. De como esconder ou assumir a idade. Aos 60
você se sente maduro, curioso e sábio ou velho, amargo e ultrapassado? O título
do filme no Brasil é assombrosamente ruim e apelativo: Late bloomers – O amor
não tem fim. “Late
bloomer” é uma expressão inglesa que denomina quem amadureceu tardiamente. Em
francês, a tradução do título é clara e objetiva: Trois fois vingt ans (Três
vezes 20 anos). Uma conta básica de multiplicação mostra que você já viveu
bastante. Um dia teve 20 anos. Também comemorou ou receou os 40. E agora, aos
60, passa para o timedos velhos. Ou não?
Isabella Rossellini
(Mary) e William Hurt (Adam) fazem o casal protagonista. Devido a um súbito
lapso de memória, a mulher, professora universitária, percebe que envelheceu e
toma medidas concretas em casa. Aumenta o tamanho dos números no aparelho de
telefone, coloca barras na banheira para o casal não escorregar. O homem,
arquiteto famoso, se recusa a se imaginar velho, passa a conviver só com jovens
e a se vestir como eles. Ela faz hidroginástica, mas se sente fora d’água,
organiza reuniões com idosas e mergulha em trabalhos voluntários. Ele vai para
o bar, bebe energéticos e vira a noite. Cada um se apega a sua visão de como envelhecer
melhor, sem concessões. Ambos acabam tendo casos extraconjugais. Há nos dois um
desespero parecido. Mary exagera na consciência da proximidade da morte. E Adam
exagera na negação. Depois de décadas de amor sólido, com os três filhos fora
de casa e já com netos, o casal se vê prestes a engrossar as estatísticas dos
divorciados após os 60 anos, ao descobrir que se tornaram estranhos e por isso ficam melhor sozinhos e
livres. O filme é uma comédia romântica para a idade avançada, um gênero quase
inexistente.
Julie Gavras não encontrou nenhuma atriz francesa que assumisse com humor os
dilemas de uma sexagenária. “Precisava de alguém com a idade certa, mas que não
tivesse feito cirurgia plástica”, diz Julie. “Isabella foi perfeita porque
entende que, quanto mais velha fica, mais liberdade tem.” Na França, diz a
cineasta, “a idade é uma questão delicada para a mulher”. No Brasil, que cultua
a juventude feminina como moeda de troca, é mais ainda. Isabella, um dos rostos
mais lindos do cinema, disse ter adorado fazer um filme sobre envelhecimento:
“São tão poucos e tão dramáticos. E minha experiência tem sido pouco dramática,
aliás bem cômica às vezes. Mulheres envelhecendo são vistas como uma tragédia e
foi preciso uma cineasta mulher para ver diferente”. A reação de homens e mulheres ao passar dos anos é diferente?
Depende. Da velhice, só escapa quem já morreu.
Homens e mulheres reagem de maneira desigual à passagem dos anos? É arriscado generalizar. Depende de cada um. Compreendo que mulheres de 60 sintam mais necessidade de parecer jovens e desejáveis – mas alguns homens idosos se submetem a riscos para continuar viris. A obsessão da juventude eterna criou um grupo de deformadas que se sujeitam a uma cirurgia plástica por ano e perdem suas expressões. Mas também fez surgir outro tipo de sexagenárias, genuinamente mais belas, mais em forma, mais ativas e
saudáveis enfim.
“As mulheres nessa idade querem aproveitar o mundo, viajar, passear, dançar,
ver filmes e peças, fazer cursos. Os homens querem ficar em casa, curtir a
família, os netos”, afirma a antropóloga Mirian Goldenberg, que acaba de
publicar um livro sobre a travessia dos 60. “Elas se cuidam mais, eles bebem
mais. Elas vão a médicos, fazem ginástica, eles engordam, gostam do chopinho
com amigos ou sozinhos. Elas envelhecem melhor, apesar do mito de que o homem
envelhece melhor. Muitas me dizem: ‘Pela primeira vez na vida posso ser eu mesma’.”
Da velhice ninguém escapa, a não ser que a morte o resgate antes. Cada um lida
com ela de forma pessoal e intransferível. O escritor Philip Roth, aos 78 anos,
diz que “a velhice não é uma batalha; é um massacre”. Mas produz
compulsivamente. Woody Allen, de 75 anos, dirige um filme por ano, mas acha que
não há romantismo na velhice: “Você não ganha sabedoria, você se deteriora”.
Para Clint Eastwood, de 81 anos, que ficou bem mais inteligente e charmoso com
a idade, envelhecer foi uma libertação: “Quando era jovem, era mais estressado. Me sinto muito mais
livre hoje. Os 60 e 70 podem ser os melhores anos, desde que você mude ou
evolua”. Prefiro acreditar em Eastwood. Por mais que a sociedade estabeleça
como idoso quem tem acima de 60, a tendência é empurrar o calendário para a
frente. Hoje, para os sessentões, velho é quem tem mais
de 80. Os octogenários produtivos acham que velho é quem passou dos 90. No
fim, velho mesmo é quem já morreu e não sabe.
"Mulheres envelhecem melhor que homens"
Por Ruth de Aquino
A afirmação é de Mirian Goldenberg, antropóloga, que acaba de publicar um
livro intitulado Corpo, envelhecimento e felicidade. Mas também é o
ponto de vista do psicanalista Sócrates Nolasco, autor de quatro livros sobre o
universo masculino, que acha a mulher acima de 60 anos mais inquieta e mais
aberta que seus companheiros sessentões. Conversei com ambos depois de assistir
a uma comédia romântica para a terceira idade, com Isabella Rossellini
(Mary) e William Hurt (Adam), o casal charmoso da foto deste post. O
filme, dirigido pela francesa Julie Gavras (Late Bloomers – O Amor não tem
fim), estreará nos cinemas no Brasil em novembro.
Comédias românticas costumam mostrar casais de 20, 30 anos, nunca 60. É
estranho, mas é assim. Cada vez mais se endeusa “o jovem”. É como se tivéssemos
um “prazo de validade”, numa cultura que não valoriza a maturidade como um
capital, apenas o corpo e a aparência. E essa visão atinge de maneira especial
as mulheres. Sofrem mais aquelas que se deixam aprisionar por alguns papéis e
querem se eternizar como se tivessem 20 ou 30 anos. Uma das questões hoje entre
muitas mulheres (da classe média à elite) é exatamente como envelhecer com
dignidade, sem cair no ridículo de bancar a menininha. Ou seja, é difícil
generalizar sobre quem envelhece melhor em relação a gêneros, mas temos algumas
pistas e podemos aprender com elas.
O filme de Julie Gavras – filha do cineasta Costa-Gavras – é mais feminino,
embora fale de um casal. As mulheres riem muito de si mesmas (ou de suas mães)
na plateia, porque algumas situações constrangedoras são universais. Quando
Mary faz acrobacias para conseguir contornar os olhos com delineador por trás
dos óculos de grau ou quando percebe que os homens não olham mais para ela
porque se tornou invisível, muitas se veem na personagem, com humor e não com
tristeza. Sentada num café, ao se deparar com sua imagem refletida no espelho,
Mary leva um choque, como se aquela não fosse ela. Estica a face com as mãos,
puxa a pele do pescoço para cima…e apela para uma écharpe salvadora.
Por causa do filme, divertido e leve, escrevi uma coluna para a Época, Entrando nos sessenta (acima).
Para o blog, decidi fazer as mesmas perguntas, separadamente, a uma mulher,
Mirian, e a um homem, Sócrates, sobre essa passagem dos 60 anos. Ambos estudam
há muito essas questões.
Percebo entre amigos duas atitudes mais frequentes nessa data: os que fazem
festança com som flashback até de manhã e convidam todo mundo pelas redes
sociais. E há os que viajam, fogem da data e preferem ignorar “a virada”.
Poucos são – no meio em que vivo – os que encaram esse aniversário com
naturalidade, como qualquer outro.
Eis as visões de Mirian e Sócrates. Ambos acham que a mulher enfrenta essa
nova fase da vida com menos acomodação, mais energia e mais curiosidade.
7×7 - 60 anos para a mulher, 60 anos para o homem.
Quais são as principais semelhanças e as principais diferenças?
Mirian Goldenberg – Existe uma inversão: as mulheres querem
aproveitar o mundo, viajar, passear, dançar, ver filmes e peças, fazer cursos…
os homens querem ficar em casa, curtir a família, os filhos, netos, valorizam
muito a esposa…. elas se cuidam mais, eles bebem mais…. elas vão a médicos,
fazem ginástica, eles engordam, gostam do chopinho com amigos ou mesmo
sozinhos. Elas envelhecem melhor, apesar do mito de que o homem envelhece
melhor.
Sócrates Nolasco – Com o aumento da expectativa de vida,
homens e mulheres estão podendo viver mais. O que percebo é que as mulheres se
mantêm mais ativas em suas vidas do que os homens que as construíram
exclusivamente em torno do trabalho. A fase após os 60 requer intimidade
consigo mesmo, uma vida que se interioriza e descobre o que a juventude jamais
poderia saber.
7×7 – ? O que a mulher especialmente pode esperar
da fase dos 60 aos 80 anos?
Mirian – Maior liberdade, maior felicidade, menos medo da
opinião dos outros, mais descobertas… muitas me dizem “É a melhor fase da minha
vida, nunca fui tão feliz, pela primeira vez na vida posso ser eu mesma”.
Sócrates - Existe algo mais triste do que envelhecer, e é
permanecer criança. É tão importante para um jovem saber que a vida não começa
nesta fase, quanto, na velhice, saber que a vida não termina com o
envelhecimento. Envelhecer no mundo de hoje é mais difícil do que era
anteriormente. A vida vazia não leva a um bom envelhecimento. Desconhecer a si
mesmo é um mau prognóstico para o envelhecimento. Autonomia e independência
emocional devem ser conquistadas através de uma vida rica e produtiva.
7×7 – O que é mais barra enfrentar nessa idade? E o
que é mais prazeroso ou libertador?
Mirian - Para a mulher que se preocupa muito com a opinião
dos outros, com a aparência, com o fato de ter um namorado ou marido, pode ser
uma fase mais complicada, pois ela vai olhar só para a natural decadência do
corpo ou para a falta de homem. Mas, para as outras, é um momento de
extrema liberdade, de descobrir novos prazeres, de ter o espaço e o tempo para
si mesma, de se priorizar.
Sócrates – ? Em cada fase da vida, existem aspectos a
administrar. Uma boa dica é entender quais são as transformações físicas e
emocionais do passar dos anos para saber como superá-las positivamente. A
superação é o destino humano, não se pode negligenciar isso. Sentir-se velho é
pior do que ter 60 ou 80 anos, e para sentir-se assim não tem idade. Poucos
sabem ser velhos, pois ao envelhecer creio que devemos nos tornar mais loucos e
sábios, nisto reside a paixão pela vida. Quem ama a vida a vive em liberdade, a
maioria dos jovens tem medo de viver o que sente.
7×7 – Como se preparar para os 60 anos?
Mirian – Tendo projetos de vida que sejam prazerosos,
investindo em si mesma, não sendo dependente dos homens ou dos filhos e
aprendendo a não se preocupar muito com o que os outros pensam. Deixando de
achar que família e filhos vão garantir a felicidade no futuro.
Sócrates – É possível e desejável se preparar, quando se
envelhece é preciso ser mais ativo do que quando jovem. A melhor maneira de se
preparar para a etapa seguinte da vida é vivendo a atual em profundidade e
conteúdo. A juventude é cansativa, preservá-la como anos dourados é tolice. É
importante saber contentar-se com o que cada fase da vida oferece para torná-la
melhor.
7×7 – Você pretende dar uma super festa aos 60?
Parece ser moda hoje em dia, embora eu tenha amigas que resolvam sumir, viajar.
Tem atriz que falsifica a carteira de identidade.
Mirian – Não, nunca fiz festa de aniversário, para mim é um
dia como qualquer outro, comemoro a vida nas minhas realizações cotidianas, não
gosto de celebrar datas específicas…. para mim, os 60 serão apenas mais uma
etapa, não necessariamente diferente de agora, que estou com 54.
Sócrates – Um escritor inglês costumava dizer que um homem
é tão mais velho quanto se sente, e uma mulher é tão mais velha quanto parece
(o que parece cruel). Na velhice, a morte fica mais próxima como fato. Não
existe uma regra para comemorar, mas fugir de si mesmo em qualquer momento da
vida não parece ser boa estratégia para quem deseja viver o último ato da
comédia humana.
7×7 – Da mesma forma que se falava na crise dos
sete anos de casamento, existe hoje uma crise do casamento aos 60 anos de
idade? Por que aumentaram divórcios na terceira idade? As idades mentais entre
homem e mulher continuam diferentes aos 60? Como valorizar o companheirismo
nessa idade e manter o amor?
Mirian – Muitos casais se renovam depois da saída dos
filhos de casa e da aposentadoria, buscam prazeres juntos, viagens, programas
culturais, conversas…. Outros descobrem que sem os filhos eles não têm muito em
comum, são estranhos que construíram uma família. A identidade da mulher, mesmo
daquela que trabalha fora de casa, está ancorada na vida familiar, em seus
papéis de dona de casa, esposa e mãe. Por isso ela se sente desobrigada de um
monte de funções aos 60 anos. Já o homem, quando se aposenta, perde uma das
principais fontes de construção e valorização da identidade masculina: o
trabalho. Ao se retirar do mundo profissional, ele provoca um problema no
espaço doméstico, antes dominado pela esposa e pelos filhos. Muitos
sexagenários se frustram porque percebem que a família não deu o retorno que
imaginavam e que os amigos são muito mais importantes nesta fase da vida.
Como hoje se vive muito mais, há um desejo de renovação, uma esperança de se
reinventar com outra pessoa ou mesmo a sós mesmo.
Sócrates – Com a possibilidade de viver mais, aumentou o
número de pessoas que querem tentar algo novo, uma fantasia, uma ilusão.
Talvez, mas o que cada um espera de sua vida? Como deseja vivê-la? Na
artificialidade da mentira de uma vida eternamente jovem, como se a juventude
não fosse aborrecida e sem profundidade? Os prazeres migram de lugar em nossas
vidas, com 10 anos são uns, com 20 e 30 outros e assim sucessivamente. Tentar
manter padrões de excitabilidade sempre nos mesmos patamares exclui a
possibilidade de formar parcerias solidárias, cúmplices e comprometidas. O amor
se aprende desce cedo através das escolhas que fazemos, e das que optamos por
não fazer. O que acrescenta, valoriza e faz crescer deve ser preservado se
quisermos realmente ser felizes.